Entrevista: Teresa Atvars, vice-reitora Unicamp na gestão 2017-2021, fala da articulação para a criação do Campus Sustentável

Entrevista: Teresa Atvars, vice-reitora Unicamp na gestão 2017-2021, fala da articulação para a criação do Campus Sustentável

Esta entrevista foi realizada em março de 2021 e constitui a quinta seção do livro Campus Sustentável: um modelo de inovação em eficiência energética para a América Latina e o Caribe, lançado em dezembro do mesmo ano. Teresa Atvars, vice-reitora Unicamp na gestão 2017 – 2021, é cientista-professora no Instituto de Química (IQ) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e desenvolveu importantes articulações, especialmente enquanto gestora, para a instauração do Projeto Campus Sustentável — Unicamp. Confere o que diz a cientista na entrevista, a seguir. 

  1. Como foi a origem da ideia da gestão da Unicamp em apoiar a iniciativa Campus Sustentável — Unicamp? Ou seja, como a instituição recebeu essa proposta?

O Planejamento Estratégico (Planes) 2016 – 2020 estabeleceu que a Sustentabilidade deveria ser um objetivo a ser perseguido por toda a Universidade. Neste sentido, enquanto fui Pró-Reitora de Desenvolvimento Universitário, busquei interagir com todos os órgãos envolvidos com o assunto da energia elétrica, fizemos várias reuniões com a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), até que a Coordenadoria Geral da Unicamp (CGU) na gestão passada assumiu este papel e criou o Grupo Gestor Universidade Sustentável (GGUS) com uma Câmara Técnica de Energia. Alguns projetos foram implantados. Quando assumi a CGU, recebi as pessoas que atuavam no assunto com um conjunto de problemas na gestão dos projetos e passei a atuar diretamente com os coordenadores, resolvendo os problemas de gestão e facilitando os encaminhamentos institucionais. Este estreitamento das relações deu certo, projetos com mais benefícios para a Unicamp foram aparecendo e passamos a classificar estes projetos como estratégicos, aprovando-os na Comissão de Planejamento Estratégico Institucional (Copei). Neste sentido e buscando dar organicidade aos projetos, o professor Luiz Carlos Pereira da Silva cria o slogan Campus Sustentável — Unicamp, passando a ajudar a Unicamp nesta área, num diálogo direto com a CGU.

  1. A Unicamp já havia realizado algum projeto semelhante o Campus Sustentável — Unicamp? Como foi acomodá-lo na estrutura do funcionamento da instituição?

No passado existiram alguns projetos semelhantes, mas nunca na dimensão que o assunto tomou nestes últimos quatro anos. Por exemplo, no início dos anos 2000 ocorreu um grande projeto com a CPFL em que foram trocadas as luminárias da Unicamp por lâmpadas mais eficientes. Depois esta iniciativa foi descontinuada. Mais recentemente houve um projeto em que foram trocadas as luminárias dos postes de iluminação, mas neste caso houve um substancial investimento da universidade. Apenas nesta gestão o assunto foi efetivamente alavancado, graças ao trabalho de muitos e a forte liderança do prof. Luiz Carlos. Mas chegou o momento em que precisávamos dar maior institucionalidade ajudando a formar uma equipe técnica da administração, tanto para colaborar na elaboração dos projetos quanto na execução e devido a isto criamos na CGU o Escritório de Projetos Especiais, em que está inserido o Campus Sustentável em Energia. Iniciamos contratação de engenheiros e este Escritório precisa crescer, mas estamos com as dificuldades impostas pela Lei Complementar nº 173 que nos impede de contratar. A ideia é que este Escritório amplie suas funções para buscar recursos externos para a sustentabilidade hídrica e outras.

  1. Qual o papel da Unicamp no desenvolvimento do Campus Sustentável — Unicamp?

A base para um projeto deste tipo depende de dois fatores, que atuam sinergicamente: conhecimento, e isto temos com nossos docentes especialistas e com nossos funcionários que estão se qualificando, e gestão, que conseguimos com a parceria entre CGU/ Diretoria Executiva de Planejamento Integrado (DEPI)/Campus Sustentável/Prefeitura dos campi. Cada um desempenha um papel: a CGU articula, coordena, resolve entraves, ajuda a priorizar projetos; a DEPI desenvolve o Plano Diretor, registra tudo de modo georreferenciado e tem os indicadores de sustentabilidade ambiental; o Escritório/Campus Sustentável busca financiamentos, elabora projetos, submete, negocia, ajuda nas prioridades em função dos editais disponíveis; a Prefeitura dos campi colabora, faz acompanhamentos, etc. Estamos implantando um modelo com começo-meio-fim, e este modelo é transferível para Prefeituras Municipais, para empresas, para a sociedade. Saímos da teoria para a prática, na minha visão, com as parcerias certas, cada um com seu papel, todos importantes.

  1. O Campus Sustentável é um dos projetos entre Unicamp e CPFL no âmbito do P&D ANEEL. Este se destaca pela sua proposta de uso do campus Zeferino Vaz como Laboratório Vivo, como a gestão Unicamp enxerga essa relação de captação de recursos,“auto injeção” e os seus efeitos para a sociedade mais ampla?

É verdade, mas não só isso. A Unicamp toda é um Laboratório Vivo. Em uma das minhas falas para a CPFL eu disse que o único laboratório completo é a universidade, porque além de implantar as tecnologias e gerar os conhecimentos, ela forma os estudantes neste processo. E digo que não só na parceria com a CPFL porque queremos ampliar para outras áreas igualmente importantes, como a das águas. A Unicamp fará isto, por criar o Centro de Águas em parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e a Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S/A (Sanasa). E podemos ampliar, para além da CPFL temos outros fornecedores de energia e temos outros tipos de energias renováveis. Precisamos criar uma estratégia para lixo e ampliar a de resíduos, e tudo isto requer, recursos substanciais que no momento não conseguimos aportar com nosso orçamento. Tudo o que fazemos é transferível para a sociedade, na forma direta replicando os projetos, ou na forma indireta formando alunos que atuarão no mundo do trabalho.

  1. O Campus Sustentável oportunizou diálogos da Unicamp com outras entidades, exemplo é o processo de aprovação da Organização Latino-americana de Energia (Olade). Como você avalia esse trabalho conjunto de novas parcerias para o desenvolvimento da Ciência, mais especificamente da eletricidade?

É verdade. A Unicamp é muito bem vista no exterior e é uma liderança latino-americana. E é muito importante que atuemos decisivamente para ajudar o desenvolvimento da América Latina. Esta é uma excelente inciativa. O mundo sempre esteve interligado pelo conhecimento. Hoje mais do que nunca isto ocorre. Veja o caso das vacinas. Quem tem protagonismo é quem tem conhecimento? A Unicamp tem este conhecimento e está sendo protagonista.

  1. A partir da abordagem realizada nestas perguntas, daquilo que é possível de ser observado dos trabalhos do Campus Sustentável — Unicamp, a senhora conseguiria descrever/projetar um possível cenário de sustentabilidade energética da Unicamp?

Eu acredito que podemos ter sustentabilidade sim, desde que as estratégias tenham continuidade. Mostrei na segunda pergunta que já houve várias iniciativas no passado e elas foram descontinuadas. Espero que o Escritório de Projetos Especiais/Campus Sustentável que criamos na CGU, em conjunto com as Câmaras Técnicas possam garantir a consolidação desta política e a continuidade das ações.  Se isto ocorrer, em médio prazo poderemos ser sustentáveis. Mas há desafios e haverá sempre. Temos que encará-los e resolvê-los, com sabedoria e desprendimento.

  1. Você pode falar algo que considere importante e não foi sinalizado anteriormente.

Como eu disse antes, este projeto está baseado em conhecimento e gestão. Faltando um, o outro fator terá dificuldades, como vinha ocorrendo. Ganhamos em escala enquanto os dois fatores trabalharam sinergicamente. Uma boa lição aprendida. 

Inácio de Paula |  entrevista 
Giovana Sanches | ilustração