“É sobre transformação!”, diz bolsista sobre o Programa de Extensão Olhos no Futuro

“É sobre transformação!”, diz bolsista sobre o Programa de Extensão Olhos no Futuro

Sou Daniel Correia, morador de Campinas, mais especificamente, da Favela do São Marcos. Descrevo minha origem, pois acredito que seja um ponto fundamental para que as pessoas entendam que tenho uma vivência que me permite falar sobre determinados assuntos e com a segurança de que digo sobre algo que vi e, ainda mais, vivi. Além de morador de uma comunidade, sou negro, portanto, sempre tive, desde cedo, que lidar com as dificuldades que a sociedade impõe a quem vem de onde eu vim.

Sou filho de professores da rede pública, estudei sempre em colégios públicos, com o acompanhamento de perto de quem sabia que a educação é a chave para a mudança.

Ingressei no curso de Engenharia Química na Unicamp no ano de 2018. Era um mundo completamente diferente do que eu estava acostumado. A rotina, a realidade, os círculos sociais, era tudo uma grande novidade, mas meu objetivo era, e ainda é, o que me guia: poder levar para a minha comunidade o conhecimento que ainda é nos dias de hoje extremamente elitizado.

Além disso, sempre tive interesse em estudar energias renováveis, tendo em vista os indicadores globais alarmantes, que mostram que estamos passando por um processo contínuo de aumento da necessidade de se estudar novas possibilidades de energia a serem utilizadas. Foi um dos motivos para que eu escolhesse o curso de Engenharia Química.

Nesse contexto, ter a possibilidade de fazer parte de um projeto que pudesse justamente trabalhar com reutilização de recursos para produção de energia, como é o caso do Etanol de Segunda Geração, foi, para mim, um presente.


Em 2019, entrei para a equipe do projeto “Olhos no Futuro”.


O projeto realizado pela FEQ, desenvolvido em conjunto com as professoras Aline Carvalho e Roberta Ceriani e as alunas Flávia Belinelli e Jade Almeida, tem como objetivo estudar o processo de produção do Etanol de Segunda Geração, com o intuito de analisar a viabilidade do processo, passando pela etapa de pré-tratamento, hidrólise, fermentação e destilação.

Além da parte experimental do projeto, fundamental para que possamos ter embasamento científico para a continuidade, atuaremos diretamente na Escola Dr. Telêmaco, com diversos projetos, aproximando os alunos do ensino médio aos conteúdos que estão por trás do estudo da produção do Etanol 2G, especificamente para cada uma das etapas, com experiências que irão desde aulas ministradas em sala, até visitas nos laboratórios da FEQ.

Para isso, faremos um levantamento e um estudo voltado para os professores da escola, com o intuito de firmar um diálogo entre a universidade pública e a escola estadual, de tal forma que não tenhamos nenhuma defasagem nos conteúdos, tornando a experiência dos estudantes extremamente proveitosa.

Até o presente momento, no período anterior à pandemia, demos os passos iniciais em laboratório, com o estudo do pré-tratamento, e da hidrólise. Para cada etapa, existem muitas formas de realizarmos os procedimentos, com várias técnicas diferentes.

Para o pré-tratamento, utilizamos o método químico, sendo os reagentes o peróxido de hidrogênio (H2O2) e o hidróxido de sódio (NaOH), pois a reação somente ocorre em meio básico. Isso acontece para que possamos extrair a lignina, tornando a celulose mais acessível.
A outra etapa realizada também em laboratório foi a hidrólise, que se consiste basicamente na formação de açúcares que irão, posteriormente, participar da etapa de fermentação. Assim como para o pré-tratamento, existem diversas técnicas que podem ser utilizadas também na etapa de hidrólise, sendo as principais: hidrólise enzimática e hidrólise ácida. As posteriores etapas ainda serão realizadas.

Os estudantes terão contato direto e indireto com o que é um laboratório, entendendo como é o trabalho de um pesquisador e todo o caminho que se percorre em uma pesquisa. Serão ministradas aulas teóricas e práticas, na escola e na Unicamp, abordando todo o conhecimento adquirido ao longo da pesquisa.

A intenção do projeto é tornar os estudantes agentes ativos na transformação de suas vidas e, posteriormente, na vida dos outros em suas comunidades. Assim como o processo de produção do Etanol 2G, que podemos definir como a transformação de uma matéria prima em um produto de interesse, os estudantes da Escola Dr. Telêmaco irão, ao final do projeto, agir como transformadores, para si e para os outros. Levar essa experiência aos mesmos irá não só fazer com que simplesmente participem e possam dizer aos colegas sobre as atividades que irão realizar, mas fará com que tenham conhecimento acerca de uma realidade que, ao menos para mim, parecia extremamente distante.


O projeto como um todo é sobre “transformação”.


Como pode ver, o projeto tem como objetivo não só o desenvolvimento do estudo a respeito de um processo químico, mas principalmente o diálogo com estudantes da escola pública Dr. Telêmaco. Com esse intuito, algumas outras atividades serão desenvolvidas, como a roda de conversa para que possamos fazer um primeiro diálogo com os estudantes, para que assim possamos conhecê-los, entender a realidade e o que eles imaginam que será desenvolvido.  O intuito é que no término da conversa, eles possam ter em mente a importância do que irão realizar e, ao mesmo tempo, incentivá-los a participação nas atividades posteriores, na universidade, na escola, e, também, fomentando suas participações nas atividades a serem desenvolvidas pelas outras faculdades por meio do Programa de Extensão “Olhos no Futuro”.

Um projeto que atinge especialmente uma parcela da população da qual eu faço parte, com o intuito de incentivar a participação, mostrando o que a Universidade pública pode oferecer, é exatamente o que eu, como pessoa, com a vivência que tenho, sempre quis. Poder fazer parte desse projeto, como disse, é mais do que apenas uma oportunidade de desenvolver uma pesquisa, é ter a certeza de que serei agente ativo da transformação de pessoas como eu, que vieram de onde eu vim e que podem alcançar lugares ainda mais altos. É sobre transformação!

Daniel Correia | graduando Eng. de Química e bolsista de IC/Funcamp no Programa de Extensão Olhos no Futuro | texto escrito
Giovana Sanches | Campus Sustentável | texto imagético