08.04.2021 Aldeias do Amapá ganham geração de energia elétrica fotovoltaica nos Polos Base de saúde
Indígenas participaram do curso de capacitação e estão aptos as operações dos módulos fotovoltaicos
Fonte de energia renovável para garantia do funcionamento dos Polos Base de saúde das aldeias Kumenê e Kumarumã, no Oiapoque (AP). Este é o principal motivo da ação coletiva entre a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé) e a Easy Watt, empresa de projetos e instalações.
Rafael Carneiro, engenheiro eletricista, informa que foram instalados 20 módulos fotovoltaicos de 330 watt-pico (Wp) e disponibilizadas oito baterias de 220 ampère-hora (Ah) em cada uma das unidades. A energia elétrica gerada pelos painéis fotovoltaicos é mandada pelos carregadores para as baterias, que são capazes de dar subsídio por até três dias em casos de menor intensidade solar.
“Durante esse espaço de tempo, mesmo com chuvas, é possível manter as geladeiras de vacinas, o wi-fi (waifai), o microscópio para exame de malária, o nebulizador, a iluminação, tudo funcionando”, exemplifica o engenheiro. Até então, o fornecimento de energia elétrica ocorria com interrupções, por exemplo, na aldeia Kumenê funcionava das 10h às 13h e das 16h às 22h e na Kumarumã das 16h às 23h.
Financiado pela Embaixada da França, o trabalho faz parte de uma iniciativa maior com duração de cerca de seis anos e abarca o território do Amapá e a região Norte do Pará. Agora apenas duas aldeias, Kumenê do povo Palikur e Kumarumã do povo Galibi Marworno, foram beneficiadas. Elas somam uma população com pouco mais de 5 mil indígenas.
A exemplo do recente apagão que atingiu a maior parte do Amapá, a pesquisadora Ana Moreira, antropóloga responsável pela mediação entre comunidades internas e externas, destaca que, até então, as comunidades possuíam total dependência da Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA). A distribuidora é encarregada de enviar em média 22 mil litros de óleo diesel por mês, que alimentam os geradores de eletricidade das duas aldeias.
Além dos impactos negativos gerados ao meio ambiente pelo modelo de geração elétrica a diesel, a antropóloga chama atenção para falhas do serviço prestado pelo poder público. De acordo com ela, nem sempre o combustível chegava às comunidades e, às vezes, os geradores quebram, potencializando a instabilidade no atendimento de saúde.
“Como as instalações dos sistemas fotovoltaicos foram feitas nos Polos Base, lugar de referência de saúde da aldeia, os impactos se voltam diretamente para isso. Cito a possibilidade de agora ter geladeiras de vacinas nas duas comunidades. É um fator muito relevante, pois o deslocamento para o Oiapoque (à cidade) não é uma coisa fácil e as crianças (indígenas) estavam tendo que ir para tomar as vacinas. Inclusive, muitas delas não estão vacinadas”, disse a antropóloga.
Capacitação
“A ideia era a instalação fotovoltaica e depois, a Unicamp entraria ofertando um curso a respeito de manutenção para os moradores. Conforme ocorria o diálogo, acabamos formatando uma estratégia um pouco diferente. Eu fui com a Easy Watt fazer as instalações e, na oportunidade, realizamos também uma oficina de instalação, operação e manutenção, capacitando a mão de obra local para esses serviços”, enfatiza Rafael Carneiro.
De acordo com o engenheiro, o Iepé selecionou moradores interessados em participar da oficina e, pelo menos, dois indígenas das respectivas comunidades, Kumenê e Kumarumã, com mais duas outras pessoas ligadas ao Instituto, concluíram a capacitação e foram certificados.
A antropóloga Ana Moreira menciona que o projeto foi escrito pela equipe do Iepé, com a Artionka Capiberibe, antropóloga e professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH/Unicamp) e o Luiz Carlos, professor da Faculdade de Engenharia Elétrica e Computação da (FEEC/Unicamp) e coordenador do Campus Sustentável – Unicamp.
Deslocamento
“Nós saímos de Campinas para Macapá (AP) de avião, com escala em Belém (PA). De Macapá, nós dormimos lá e no dia seguinte saímos para pegar por volta de 10 e 12 horas de estrada se tudo der certo. Nós pegamos a BR 156, entre Macapá e o Oiapoque. A BR-156 tem uma parte asfaltada e outra que não possui asfalto. Inclusive, é a obra mais antiga [mais de 80 anos] do Brasil”, contextualiza o engenheiro.
Como aquela região se encontra na estação do inverno, segundo Rafael, chove quase diariamente, o que dificultou ainda mais o percurso terrestre. Máquinas pesadas, como tratores, estão em locais estratégicos onde possuem difícil tráfego e ajudam a puxar os veículos atolados. Somente neste percurso de estrada, a equipe gastou 18 horas. Depois, foram mais cinco horas de barco até chegar à aldeia Kumenê. Em seguida, mais três horas até a Kumarumã.
Foram contabilizados 14 dias, somando o tempo de ida, o período de atividades e o regresso para Campinas. Oito dias e meio nas comunidades indígenas e cinco dias e meio de deslocamento. “Chegamos ao Oiapoque e não tinha combustível para os barcos irem até às aldeias, o caminhão que leva o combustível estava atolado, ultrapassamos ele. Foi quando tivemos que esperá-lo um dia”, finaliza.
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Inácio de Paula | Jornalista de ciência do Campus Sustentável – Unicamp | texto escrito
Giovana Sanches | Ilustração Campus Sustentável – Unicamp
Imagens | acervo da equipe de viagem